Arte incrível de alguém desconhecido mas que me intrigou. |
Como aconteceu na vida de uma pessoa que vocês nunca
ouviram falar. Ela é normal. Gente boa, quieta e normal. Nunca procurava por
objetivos e nem se incomodava em pensar nisso. Tudo estava bom, e ela se sentia
bem normal. Normal a ponto de se entediar com a normalidade de seu cotidiano e
resolver tentar mudar isso, da sua própria forma é claro, que não deixava de
ser muito normal. Normalidade à parte, ela resolveu definitivamente que iria
fazer algo para mudar sua rotina. Pois até então, nunca reclamava, nunca
impunha sua opinião, não fazia perguntas, nada – o que apenas prova que ser
normal é realmente um saco. E isso é só o que vocês precisam saber sobre ela.
Então em uma tarde incomodamente quente no trabalho, ela se levantou e foi em direção à caixa de
sugestões/reclamações/elogios/denúncias/informações, pegou a caneta, o papel
com linhas irritantemente pontilhadas para se escrever sobre, pensou durante
três minutos, e escreveu.
“Se as pessoas devessem
menos do que deveriam dever, um mundo sem dívidas seria uma dádiva divina, onde
deveres não se dividiriam em pequenas divindades depravadamente duvidosas. O
que devemos fazer?”
A mocinha do RH quando pegou
sua sugestão, naquele final de tarde agora um pouco menos incomodantemente
(tenho dúvidas se isso existe) quente, o leu, releu, parou, pensou, leu
novamente, se perdeu em pensamentos, voltou a se concentrar naquela ideia e
depois de três minutos, tomou uma decisão.
No dia seguinte ela se
demitiu do emprego, raspou a cabeça, viajou pelos sete mares, entrou de corpo e
alma em uma nova filosofia de vida, se mudou para uma caverna no alto de uma
montanha, passou a fazer pequenas refeições diárias, aprendeu a meditar, a
lutar no estilo louva-a-deus, deu nome a uma pedra, aprendeu a sorrir ao invés
de criticar, e quando alcançou uma idade avançada, olhou para trás, e para tudo
o que havia deixado e comparou com tudo o que havia conquistado depois daquele
dia fatídico em que lera a sugestão. Pensou, analisou, voltou a pensar, e
depois de três minutos, sorriu, deitou-se, e morreu enquanto dormia. Não devia
nada a ninguém.
A pessoa em questão (aquela
que você não conhece) só soube de tudo isso, pois, muitos anos depois, – ainda
vivendo muitos momentos de normalidade – leu o livro fruto da real história
daquela mocinha.
Após ler a própria sugestão
– que nem ao menos se lembrava – parou para pensar e fechou o livro, olhou para
o céu, pensou novamente, sorriu para o vento, pensou no seu passado, voltou a
se concentrar naquela sugestão indagadora, e após três minutos reabriu o livro
e voltou a ler. Aquela foi uma agradável tarde de primavera. O chá nunca
estivera tão reconfortante.
E eu aposto com todas as
minhas incertezas e medos de que se o universo pudesse rir ele teria uma
gargalhada medonha para momentos como este, porém inaudível para as pobres
almas humanas que são vítimas de suas piadas.
Hoje faz 15 anos que Douglas Adams pegou a rota para O Restaurante no Fim do Universo e nunca mais retornou, pois provavelmente foi raptado "acidentalmente" por algum sofá de mau humor... Mas não antes de nos agraciar com todo o seu conhecimento sobre A vida, o Universo e Tudo mais. Esse texto é em homenagem ao gênio inigualável da ficção científica cômica.
Até mais, e obrigado pelos peixes.
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